Criptoativos: O que são, como funcionam e como se tributa no Brasil

Imagem de um CRIPTOATIVOS

1 – O QUE SÃO CRIPTOATIVOS

O avanço de inovações tecnológicas é, sem dúvidas, um marco na história que caracteriza a pós – modernidade. A chamada era digital ou era da informação permite que as pessoas se conectem virtualmente, em tempo real, a qualquer hora do dia. Não apenas isso, permite que uma grande parte das atividades (arriscamos dizer que a maioria) realizadas pelo ser humano esteja disponível através de alguns clicks por meio de computadores, tablets celulares, relógios e qualquer outro aparelho digital.

A influência desse novo tipo de organização que tem como ponto central o uso da tecnologia e tem o meio digital como ambiente de trocas, reflete de forma significante na organização econômica da sociedade. Um novo tipo de economia pode ser observado: a economia virtual1. Nesse panorama observa-se que a internet está sendo utilizada como canal de realização de transações negociais como transferências, pagamento, empréstimos, câmbio de moedas etc.

Outrora o avanço mais impactante no mercado financeiro foi a transição do papel moeda, por meio do qual tradicionalmente se desenvolveram as transações na economia, para os cartões magnéticos. Sob uma ótica ainda mais recente verifica-se que os bancos digitais ganham popularidade entre as pessoas que procuram praticidade e menos burocracia para realização de demandas financeiras. De maneira objetiva, pode-se dizer que hoje é possível realizar (quase) tudo por meio de um aplicativo virtual no celular ou no computador.

Todas as inovações financeiras aduzidas estavam interligadas ao império do poder estatal por meio de bancos que monopolizam e centralizam as operações financeira sob sua tutela servindo de intermediários das transações realizadas em moeda. Contudo, de forma surpreendentemente inovadora, surgem as criptomoedas com a promessa de revolucionar toda a lógica já estabelecida para interação econômica mundial.

Afirma-se isso porque a tecnologia por trás das criptomoedas faz com que todas as suas transações ocorram sem que exista um terceiro intermediador – como é no caso dos bancos – o que traz implicações positivas, como a praticidade, rapidez, e menos custos, mas também não se pode negar a existência de insegurança e as incertezas sobre a proteção jurídica e econômica nesse meio virtual.

Não obstante, as transações por meio desses ativos financeiros chegam hoje a ter vultosos valores, como é o caso de Bitcoins da qual estima-se existirem mais de 17 bilhões1 em circulação no mundo. Isso revela urgência no estudo do tema, inclusive, na análise tributária da questão que possui relevância prática e atual. Para isso, necessário entender melhor sobre o surgimento dos criptoativos e a tecnologia por trás dessa inovação no mercado financeiro.

2 – O PROTAGONISTA DOS CRIPTOATIVOS: BITCOIN

Bitcoin como principal expoente dos criptoativos na pós-modernidade apresenta inovação tecnológica não antes vista no cenário financeiro. O surgimento dessa criptomoeda possui tecnologia que pode ser resumida em 4 etapas1: (i) a transação realizada é transmitida para a rede peer to peer (ponto a ponto), conhecida como nó, por meio das máquinas dos usuários; (ii) a rede de nós valida a transação realizada por meio da utilização de algoritmos (mineração); (iii) após a validação, a transação realizada combina-se com outras operações, com a criação de um bloco de dados; (iv) o bloco é adicionado à blockchain e não pode mais ser alterado.

A tecnologia apresentada de forma brevemente resumida acima promete maior fluidez e rapidez nas transações econômicas por meio de sistema que não precisa de um intermediador, denominado de peer to peer. Nas palavras de Satoshi Nakamoto2 “O objetivo é realizar trocas comerciais por meio de uma moeda que evite a interferência de terceiros como sistemas de pagamentos eletrônicos, bancos comerciais e até mesmo o Estado que controla e regula os meios de trocas financeiras”.

O blockchain funciona como espécie de “livro de registros” das operações, tornando pública a movimentação, sem, contudo, revelar quem foram os usuários que participaram da transação. Todo o sistema de operação desse ativo digital é pensado de modo a criar uma relação horizontal de poder, não submetido ao controle estatal, não sendo possível à nenhuma nação regular diretamente a sua valorização.

O grande diferencial do Bitcoin enquanto ativo digital é justamente a sua popularidade e confiabilidade, pois, em se tratando de ativo cujo lastro é a “confiança” de seus usuários, saber que não haverá intervenção nem tampouco existe submissão a um criador faz do Bitcoin o alvo perfeito para investimentos a longo prazo.

Diante desse panorama, os governos estão buscando formas de regular a utilização e as transações por meio das criptomoedas, de modo a evitar que sejam uma alternativa livre de tributação ao uso da moeda oficial.

3. A EXPERIÊNCIA DE NOVA IORQUE

O governo do estado de Nova Iorque, receoso com o avanço1 da utilização das criptomoedas em detrimento do mecanismo estatal de valor, expediu um documento de 44 páginas em que disciplina e regulamenta o uso de criptomoedas2.

Pelo ordenamento jurídico estadunidense, cada ente da federação tem aptidão para formular seu próprio regramento acerca da regulamentação e tributação dos criptoativos.

O estado de Nova Iorque tornou-se ponto focal das discussões por ser um dos maiores epicentros financeiros do país. Assim, ao contrário da decisão tomada pelo estado da Califórnia, de adiar um eventual regramento estatal ao uso de Bitcoins, Nova Iorque sentiu a necessidade de agir de modo a ter mais transparência e evitar fraudes na comercialização de criptomoedas.

A influência das moedas virtuais era tamanha que em 2013 foi fundada a “BitCoin Center”, empresa de exchange localizada a apenas alguns metros da bolsa de valores em Wall Street. Porém, com a iminência da regulamentação das Bitcoins o centro foi obrigado a declarar falência3. Considerando a experiência fracassada do BitCoin Center, diversas exchanges deixaram de atender residentes de Nova Iorque.4

Estão sujeitos ao regime de fiscalização nova iorquino e à aquisição de uma “licença de uso” todos que5 (i) pratiquem transmissão de moeda virtual (ii) guardem, armazenem, mantenham custódia ou controlem moedas em nome de outrem (iii) comprem ou vendam moedas virtuais de forma habitual (iv) pratiquem atos de “exchange” (v) administrem ou fabriquem moeda virtual.

Conhecido como “BitLicense”, o regulamento criado pelo departamento de serviços financeiros nova iorquino revelou-se como nocivo ao desenvolvimento e comercialização de moedas virtuais, fazendo com que tanto os usuários de criptomoedas quantos as exchanges transferissem-se para outros estados ou países.

Um estudo britânico6 revela que um dos principais fatores que ensejam o afloramento do mercado de criptomoedas é a legislação favorável, pois, não por acaso, exigências como as do estado americano acarretam em grande empecilho ao funcionamento de exchanges e, por consequência, afetam todo o mercado virtual.

A lentidão do mecanismo americano fica estampada em casos como o da BitStamp7, empresa de exchange que só obteve a licença para funcionamento – a BitLicense – três anos após a requisição.

A experiência de Nova Iorque demonstrou que por mais atraente que seja o mercado local, a regulamentação legislativa é fator de peso para a manutenção das operações em criptomoedas. Cabe ao Brasil, a partir dos exemplos internacionais, conseguir equilibrar a segurança jurídica trazida por um sistema de regras claras de modo a não inviabilizar o próprio uso da tecnologia.

4. CONCLUSÃO

A fluidez e anonimato das operações financeiras realizadas virtualmente por meio de criptoativos são um desafio a ser enfrentado pelos entes tributantes à medida que os contribuintes pretendem fugir do controle estatal e das grandes corporações.

Como uma das maiores expressões dessa inovação tem-se a tecnologia do blockchain que é utilizada nas transações com a criptomoeda Bitcoin

A análise dos instrumentos normativos já publicados no Brasil, como recentes instruções normativas da Receita Federal e comunicados do Banco Central, demonstram que há um despertar para a necessidade de disciplinar o uso de criptomoedas no país, porém, as instruções ainda são muito incipientes, o que contribui para a sensação de insegurança jurídica.

Assim, observadas as experiências de tributação de Bitcoin ao redor do mundo, pode-se constatar que a discussão sobre a natureza jurídica dos ativos digitais está avançando no plano internacional. É importante, por exemplo, analisar experiências como a de Nova Iorque que tiveram resultado aquém do esperado e verificar o andamento de outras experiências ao redor do mundo.

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Lucas Parolin

OAB/BA 63.946